domingo, 30 de outubro de 2011
Desvendando o original - Boxe
Muitos podem estar pensando: “mas que versículo é esse em que aparece a palavra ‘boxe’ na Bíblia?”. A Bíblia Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH), da Sociedade Bíblica do Brasil, traduz assim 1 Coríntios 9.26: “Por isso corro direto para a linha final. Também sou como um lutador de boxe que não perde nenhum golpe”. Muitas pessoas que criticam a NTLH afirmam ser este um exemplo de que esta versão não é confiável, tendo em vista que Paulo não poderia se referir ao boxe, pois este seria, supostamente, um esporte que não existia à época. Porém, uma análise mais acurada do texto, e do contexto histórico em que foi produzido, nos conduzem a outra conclusão.
A versão mais famosa que conhecemos dessa passagem, a João Ferreira de Almeida Revista e Atualizada, traz a seguinte tradução de 1 Coríntios 9.26: “Assim corro também eu, não sem meta; assim luto, não como desferindo golpes no ar”. Se analisarmos o termo “luto” em grego, veremos que se trata da palavra pukteo. O Dicionário Strong define essa palavra como “boxear, utilizando os punhos, ou seja, lutar como um boxeador nos jogos. Figurativamente, lutar”. Ou seja, o sentido literal do termo pukteo é “boxear”, pois deriva de pux, que significa “punho”, e origina os termos pygme (“lutar boxe”) e pyktes (“boxeador”). A própria palavra “pugilista” deriva da raiz grega pux, que originou o termo latino pugil (“boxeador”) e pugnus (“punho”). Assim, vemos que a prática do boxe era muito famosa não apenas entre romanos, mas célebre desde os gregos e seus jogos olímpicos.
Jovens lutam boxe. Afresco da civilização minóica, em Acrotiri, Santorini, cerca de 1500 a.C.
Concluímos, portanto, que Paulo, grande conhecedor da cultura grega e romana, estava fazendo alusões às práticas esportivas (boxe e corrida) tanto gregas como romanas. Cabe lembrar que Paulo está escrevendo para os coríntios, habitantes de uma das mais famosas cidades gregas, que conheciam perfeitamente a prática do pygme, ou seja, o boxe grego. O apóstolo estava se referindo aos famosos Jogos Ístimicos. Em honra a Poseidon, a cada dois anos eram promovidos os Jogos Ístmicos, que tiveram extraordinária importância e esplendor na antiga Hélade. Eram realizados no Istmo de Corinto, ponto de ligação entre a Grécia continental e o Peloponeso. Esses torneios recebiam um grande número de participantes e espectadores, levando-se em consideração o fato de Corinto ser um dos mais importantes centros comerciais e de diversões daquele tempo.
Confrome Eusébio de Cesareia, em sua crônica 70, o boxe foi primeiramente considerado um desporto olímpico em 688 a.C., na 23ª olimpíada da antiguidade; seu vencedor foi Onomastus de Esmirna, que foi quem definiu as regras do esporte. O boxe era chmado de pygme ou pygmachia entre os gregos, que treinavam com sacos de areia chamados korykos e usavam faixas de couro nas mãos, como luvas, conhecidas como himantes. O boxe também foi praticado desde os primórdios da Roma Antiga.
As origens do boxe, porém, são mais antigas. Surgido no continente africano, remonta ao ano 6000 a.C., na região da atual Etiópia, de onde se difundiu primeiro à antiga civilização egípcia e aos povos mesopotâmios vizinhos, onde encontramos baixo relevos de boxeadores que datam do ano 5500 a.C. Do Egito, passou à civilizção minóica, em Creta, e de lá passou à mesopotâmia e chegou à India.
Boxeador de Quirinal. Escultura em bronze do período helenístico (século I a. C.). Note-se as faixas na mão esquerda do "boxeador de Terme". (Museu de Roma).
Por esta razão, conluímos que a tradução da NTLH foi muito pertinente, conforme é a opinião dos maiores comentaristas bíblicos. Adam Clarke (1760-1832), teólogo metodista e erudito bíblico britânico, explica que a expressão grega aera derein, traduzida por “golpes no ar”, deve ser interpretada como um treino de luta de boxe, em que o lutador praticava os golpes desferindo socos ao vento, prática relata por Virgílio (70 a.C-19 a.C.) em sua Eneida (verso 375). No comentário de Archibald Thomas Robertson (1863-1934), renomado erudito do Novo Testamento, lemos que “um boxeador agia assim quando treinava sem adversário, prática que era chamada pelos gregos de skiamachia (‘lutar com a sombra’)”. No comentário People’s New Testament, lemos que “Paulo usa, primeiramente, a figura de um corredor que possui um objetivo específico. A segunda figura é retirada do boxeador que erra o oponente o atinge o ar”. O grande comentarista Albert Barnes também confirma que se trata e uma luta de boxe, assim como o comentário Marvin R. Vincent (1834-1922).
Paulo, portanto, nos exorta a desferimos golpes certeiros, de modo que não percamos nossa energia com golpes ineficientes e, assim, evitemos o risco de receber um contra-ataque devastador.
Este é, portanto, mais um exemplo de que a Nova Tradução na Linguagem de Hoje é extremamente elucidativa e, pelo menos por mim, altamente recomendada.
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