“Porque
todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus.
Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em
temor, mas recebestes o espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba,
Pai. O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus”
(Romanos 8.14-16).
1- No texto
acima, o apóstolo Paulo deixa claro que Deus é como um pai que adota filhos.
2- Mas o
sinal de que alguém foi adotado pelo Senhor é o fato de ser guiado pelo
Espírito Santo.
3- Portanto,
para que a pessoa seja feita “filha de Deus” (João 1.12) ela deve ser guiada
pelo Espírito Santo.
4- Portanto,
para conduzirmos alguém para ser adotado por Deus, convém que esta pessoa
conheça o Espírito.
5- E não há
maneira melhor de conhecer o Espírito Santo do que através da música, dos
louvores, da adoração.
6- Em seu
livro Elaborações Musicais (1991), Edward Said ressalta a influência da música
clássica na elaboração do espaço social, comparando as salas de concerto do
século XX com os museus e bibliotecas.
7- Todavia,
as salas de concerto se diferenciam, pois a execução de uma orquestra se
desenvolve em um determinado espaço e tempo, de modo que a performance
desempenha papel crucial.
8- É possível
reler um livro ou visitar uma exposição de arte pela segunda vez, mas, segundo
Said, “não faz sentido rever um concerto, embora a indústria fonológica tenha
alterado isso consideravelmente” (p. 22).
9- A música
cria relações e espaços. No caso da música cristã, esta deveria promover um
canal de relação com Deus e levar-nos a outro ambiente, que extrapola o físico
em direção ao espiritual.
10-
Em hebraico, a palavra “cantar” (shiyr) é semelhante
aos termos “corda” (shôr) e “umbigo” (shôrer).
11-
Isso porque o louvor é como uma corda que nos une a
Deus, como um cordão umbilical que nos conecta ao Senhor e traz Sua presença
para perto de nós, nos adotando como filhos e confirmando com nossos espíritos
que somos filhos de Deus.
12-
Mas não basta conhecer. Para ser filho, é necessário
ser guiado pelo Espírito, como o apóstolo João afirma: “O vento sopra onde
quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo
o que é nascido do Espírito” (João 3.8).
13-
Para ser filho, é necessário ser nascido do Espírito.
E quem é nascido, também é por Ele conduzido.
14-
Em grego, o verbo “guiar” ou “conduzir” é ago,
a mesmo termo que dá origem à palavra “pedagogia” (“conduzir a criança”). Ou
seja, o Espírito nos conduz assim como um professor que educa seu aluno ou um
pai que ensina seu filho.
15-
Em hebraico, o termo para conduzir é nahag,
como em Deuteronômio 4.27.
16-
O curioso é que a palavra “tangedor” (nagan,
2 Reis 3.15) está diretamente relacionada nahag (“conduzir”).
17-
Assim vemos que o tangedor, ao criar sons, melodias e
harmonias, estabelece um canal de comunicação espiritual, de modo que o Senhor
passa a guiar, conduzir e levar (nahag)
o homem à compreensão de que, em Cristo, fomos adotados por Deus como filhos.
Assim, aprendemos, na prática, que “Deus habita em meio aos louvores” (Salmos
22.3).
18-
Ser guiado pelo Espírito significa deixá-lo conduzir
nossa vida, como um tutor.
19-
Quando passamos a ser guiados por Ele, recebemos o
“espírito de adoção”, ou seja, Deus confirma em nosso espírito que somos seus
filhos.
20-
Em hebraico, não temos na Bíblia uma palavra
específica para adoção. Hoje em dia, porém, o hebraico contemporâneo utiliza
para “adotar” o termo la’amets, e para “adotado” a
expressão me’umats (masculino) e me’umetzet (feminino).
21-
Essa palavra é muito interessante, pois está
relacionada ao termo bíblico ‘amats, que significa “forte”
(Gênesis 25.23); “obstinado” (Deuteronômio 2.23); “corajoso” (Deuteronômio
31.6); “poderoso” (2 Samuel 22.18); “conseguir” (1 Reis 12.18); “corroborar” (2
Crônicas 11.17); “prevalecer” (2 Crônicas 13.18); “revigorar” (Salmos 31.24);
“firmar” (Provérbios 8.28); “fazer escolha” (Isaías 44.14) e “reunir” (Naum
2.1).
22-
Relaciona-se com o termo matstsah, que significa
“pão asmo”, ou seja, o pão sem fermento, que representa uma vida pura, que não
foi corrompida pelo pecado, como Jesus nos ensinou (Mateus 16.6, 11, 12; Marcos
8.15; Lucas 12.1).
23-
Relaciona-se com matsa', que significa “encontrar”
(Gênesis 4.14).
24-
Relaciona-se a matsah, que significa “beber”
(Salmos 73.10).
25-
Saussure e as dicotomias.
26-
Significante X Significado.
27-
Essa relação entre significante e significado também
pode ser aplicada à música.
28-
Antônio Vicente Pietroforte, no texto A Língua como
Objeto da Linguística (2004), escreve o seguinte sobre o tema:
O
significante da língua é uma imagem acústica, que, quando se realiza na fala,
forma uma substância sonora. Sendo da ordem do som, sua realização acontece no
tempo, tomando a forma de uma duração. Contrariamente aos significantes
visuais, que se realizam no espaço, os significantes sonoros, como os
significantes linguísticos ou musicais, realizam-se no tempo, de modo que dois
sons só se realizam em uma sucessão (PIETROFORTE, 2004).
25.
Ou seja, na música, também há significantes e
significados. Os sons também significam.
26.
Temos, na Bíblia, exemplos claros de que os sons
musicais têm significado especial na rede de comunicação entre o homem e Deus.
27.
Em 2 Reis 3.15, vemos que Eliseu precisava receber uma
mensagem de Deus, mas precisava criar uma atmosfera favorável ao contato
divino.
28.
Então, pediu que fosse trazido um músico.
29.
E aconteceu que, enquanto “o tangedor tocava, a
mensagem de Deus achegou a Eliseu”.
30.
O curioso é que, em hebraico, a palavra “tangedor”
(nagan) se relaciona com os termos “manhã” (nogah, Daniel 6.19), “luz”,
“resplandecer”, “brilhar” (nagah, 2 Samuel 22.29, Jó 18.5, Jó 22.28),
“resplendor” (negohah, Isaías 59.9), “aurora” (Provérbios 4.18) e “levar”,
“conduzir”, “guiar” (nahag, Gênesis 31.18; Deuteronômio 4.27; 2 Samuel 6.3).
31.
Isso porque a o instrumentista (nagan) é capaz de trazer
a luz (nogah) divina e o resplendor (negohah) da glória de
Deus através das notas musicais tocadas.
32.
Assim, se estabelece, através da música, um canal de
comunicação espiritual, composto por significantes e significados de natureza
sonora, e o Senhor passa a guiar, conduzir e levar (nahag) o homem à
compreensão do caminho, da verdade e da vida (João 14.6), pois “Deus habita em
meio aos louvores” (Salmos 22.3).
Daniel
Lopez é Bacharel em Teologia pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), em Comunicação Social
- Jornalismo pela UFRJ, Mestre em Linguística pela UERJ e Doutorando em
Linguística pela UFF. É colunista do portal Lagoinha.com e Diretor de Teologia
do Instituto Hope House.
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